OPERANDO  SUA  PRÓPRIA  SALVAÇÃO

por Morris Venden

 

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o final de uma tarde um missionário cristão e um bonzo (monge budista) estavam viajando nas frias montanhas do Tibete. Sabendo que ninguém podia sobreviver na trilha depois do escurecer, ambos os viajores estavam ansiosos por chegar ao mosteiro localizado alguma distância adiante. Eles se apressaram o máximo possível contra o sol, mas pouco antes do anoitecer, ouviram gemidos vindos debaixo da trilha íngreme.

Eles olharam sobre a beira da estrada e ali viram um homem que havia caído sobre algumas rochas abaixo. Ele não podia se mover por causa dos ferimentos, e era óbvio que se achava em grande dificuldade.

O bonzo olhou pensativamente para o homem ferido e disse: "Em minha religião, chamamos a isto de carma. Isto significa que este homem foi ferido como resultado de uma causa. Evidentemente, sua sina é morrer aqui, mas o meu destino está ainda adiante de mim. Devo apressar-me para o mosteiro antes que anoiteça.''

O missionário cristão respondeu: "Esta alma pobre e desamparada é meu irmão. Não posso deixar que ele morra aqui. Devo descer e tentar ajudá-lo, não obstante o que possa me acontecer.''

Enquanto o bonzo apressava o passo em direção do mosteiro, o missionário descia o escarpado penhasco. Chegando finalmente ao local onde o homem ferido jazia moribundo, ele tirou suas vestes exteriores e as enrolou em torno do homem, ergueu-o aos seus ombros e com grande esforço tornou a alcançar finalmente o trilho.

Escurecia no momento em que ele chegou dentro dos limites das luzes do mosteiro, mas enquanto se apressava em direção desse lugar de refúgio, ele tropeçou sobre alguma coisa na trilha. Olhando para baixo, percebeu o corpo sem vida do bonzo que, na escuridão e no frio, já havia caído na trilha.

Ora, a história parece melodramática, e hesito em contá-la por este motivo. Talvez seja apenas uma parábola, mas demonstra a premissa de que ao tentarmos salvar alguém, nos salvamos a nós mesmos.

Filipenses 2:12 nos diz que devemos operar a nossa própria salvação, e este texto tem sido freqüentemente malcompreendido e mal-aplicado, degenerando assim o cristianismo em um sistema de obras. Contudo, Jesus nos diz que algumas obras estão envolvidas no plano da salvação: "Se alguém quer vir após Mim, a si mesmo se negue, tome a sua cruz e siga-Me. Quem quiser, pois, salvar a sua vida, perdê-la-á; e quem perder a vida por causa de Mim e do evangelho, salvá-la-á." S. Marcos 8:34 e 35.

A fim de termos uma experiência viva com Cristo, precisamos fazer duas coisas. Primeira: devemos ir à cruz diariamente com Jesus a fim de renunciar a nós mesmos e permitir que Ele assuma o controle. Isto envolve uma vida devocional diária, em que tomamos tempo significativo a sós, no início de cada dia, para buscarmos um relacionamento pessoal com Jesus através da Sua Palavra e da oração. E se buscarmos a Deus de todo o coração, O acharemos (Jeremias 29:13).

A outra coisa de que necessitamos a fim de continuarmos a crescer nesse relacionamento é outra forma de comunhão: envolvimento no evangelho por meio do testemunho e do serviço cristão. E se Filipenses 2:12 for aplicado ao serviço cristão, é fácil ver onde entra o "temor e tremor"! Mas lembre-se de que Deus opera em nós "tanto o querer como o realizar, segundo a Sua boa vontade".

Ora, aquele que procura familiarizar-se com Deus saindo e trabalhando por outros, salvará sua própria vida no processo. Com freqüência, porém, nos temos deparado com muita confusão e mal-entendido quanto ao propósito e motivação do testemunho cristão. A igreja sempre reconheceu a importância do mesmo, mas geralmente confiamos em abordagens de feitura humana para produzir os resultados desejados. Tem havido toda sorte de substitutos para a genuína motivação no testemunho.

Um método que empregamos com freqüência é a competição, lançando um grupo contra o outro. Recorremos a truques mecânicos –"incentivos iniciais", tais como alvos, gráficos e outros esquemas que se destinam a infundir em nós um senso de necessidade. E então distribuímos nossos botões, alfinetes e certificados, com todos os tipos de recompensas e reconhecimento a fim de mantermos todos trabalhando.

Ouvi acerca de um material à disposição das igrejas. Era uma prancha com duas séries de luzes, uma série de cada lado. No centro podia ser pintado o nome da classe da escola bíblica dos adultos. Se os membros da classe estudassem a Bíblia diariamente, poderiam acender a lâmpada elétrica de um lado. Se alcançassem o alvo da oferta missionária naquela semana, poderiam acender a lâmpada do outro lado. Se fossem afortunados o suficiente para alcançar ambos os alvos na mesma semana, poderiam colocar alguma folha de estanho atrás das lâmpadas para torná-las mais brilhantes.

Numa semana todos os membros da classe tinham alcançado os alvos, exceto um que estivera ausente. Os outros membros ficaram muito desapontados com aquele que havia falhado. Na semana seguinte ele deixou de estudar a lição por um dia, de sorte que outra vez eles não puderam acender suas luzes. A resultante reprovação do resto da classe quase o expulsou da igreja.

Infelizmente, tais incidentes são muito predominantes. Outros me falaram de experiências semelhantes com variações deste esquema. Ouvi de outro lugar onde as luzes eram acesas no início, e eram apagadas se os alvos não tivessem sido alcançados!

Quando temos de recorrer a estes métodos programados para levar as pessoas a ler a Bíblia, dar para as Missões, ou partilhar sua fé, estamos realmente apregoando aos outros a completa realidade de que algo está faltando em nossa própria experiência cristã. Estamos anunciando o fato de que não conhecemos a Jesus como o fundamento do nosso cristianismo e da nossa salvação. Se realmente O conhecêssemos como um Amigo pessoal, não precisaríamos ser forçados a estudar e a testemunhar.

Outro motivo usado para levar os outros a trabalhar é o pensamento de futuras recompensas. Indagamos se temos feito o suficiente para ganhar estrelas em nossa coroa. Consciente ou inconscientemente, prestamos muita atenção ao montante feito, não perdendo de vista os "créditos" que esperamos receber por nosso trabalho. É interessante notar que Israel caiu nessa mesma armadilha. Oséias descreve a nação como uma "vide frondosa" que "dá fruto para si mesmo'' (Oséias 10:1). Que tragédia quando o ego é o motivo primário para o trabalho que fazemos!

Em 1904 estas palavras de inspiração foram escritas por uma obreira cristã: "O Senhor é bom. E misericordioso, e terno de coração. Conhece a cada um de Seus filhos. Sabe exatamente o que cada um de nós está fazendo. Sabe o justo mérito de cada um. Não quereis pôr à margem vossa lista de méritos, vossa lista de condenações, deixando que Deus faça Sua própria obra? Haveis de receber vossa coroa de glória se atentardes para a obra que Deus vos confiou." Serviço Cristão, pág. 368.

"Bem", alguém perguntará, "então qual é a nossa obra?'' Em anos recentes os teólogos têm discutido sobre o que constitui o conhecimento salvador. Um grupo afirma que todos os que são finalmente salvos no reino de Deus devem ter tido "revelação especial" por" terem ouvido a história específica do evangelho. Sem isto, eles não podem ser salvos, e se estão perdidos, somos responsáveis. O outro grupo sustenta que a "revelação geral" é suficiente. As pessoas serão salvas pelo que fizeram com a luz, não importa quão pequena tenha sido esta luz. Elas podem ser salvas mesmo que nunca tenham ouvido a história do evangelho. Nenhuma destas opiniões está livre de problemas.

Se cada um vai ser salvo ou perdido de acordo com sua aceitação ou rejeição da luz que recebeu, então por que deve afinal o cristão testemunhar? Isto abre o caminho para uma grande falta de esforço, uma religião passiva, tipo "cadeira de balanço", em que podemos assentar-nos confortavelmente em casa e ocupar nossa mente com os grandes problemas teológicos e filosóficos.

Por outro lado, aqueles que crêem na "revelação especial" têm o problema de adaptar-se à explosão populacional. Conquanto tenhamos feito grande progresso nas missões mundiais, a população do mundo está crescendo mais rápido do que nossa capacidade de propagar o evangelho. E os adeptos da "revelação especial" têm recorrido aos apelos de "ajudar aos outros lá fora". Temos obrigação de ir aos vizinhos e aos campos missionários por causa da sua necessidade.

Geralmente o nosso motivo primordial para dar, ensinar e partilhar provém de um senso de obrigação. Alguém que dispõe de grandes talentos de oratória e persuasão tem conseguido levar-nos ao sentimento de culpa por não fazermos mais. Ele nos diz que cada ano, enquanto estamos assentados ali nos bancos da igreja sem fazer nada, milhões de almas humanas estão perdidas para a eternidade por não terem ouvido o evangelho. Assim, nesta tarde sairemos, apavorados. Começaremos tocando as campainhas, esperando que ninguém atenda. Já aconteceu isto a você?

No primeiro ano do meu ministério, eu pensava que as pessoas seriam eternamente salvas ou perdidas por causa do que eu fiz ou deixei de fazer. Eu saía e dava estudos bíblicos. Praticamente toda vizinhança freqüentava. Mas uma noite meu senso de oportunidade estava ausente e eu trouxe à baila um ponto doutrinário controverso antes que eles estivessem prontos para isto. Na semana seguinte alguns deles telefonaram e disseram: "Vamos ter visitas; não podemos reunir-nos esta semana." Na outra semana eles telefonaram e disseram: "Estaremos ausentes; teremos de sair da cidade." E na semana seguinte eles disseram: "Bem, suspendamos totalmente os estudos."

Minha reação foi: "Oh, não, haverá uma casa cheia de pessoas que irão se perder por causa dos meus erros." E eu fiquei a noite acordado, olhando para o teto e me preocupando com todas aquelas pessoas. A única saída pela qual pude encontrar paz foi concluir: "Doravante, darei mais dinheiro ao evangelismo do rádio e da televisão; vou deixar que os especialistas dêem meu testemunho por mim.''

Alguém surgiu com outra idéia que parecia resolver o meu problema: "Eu preferiria ver um sermão a ouvi-lo. Se você apenas levar um bom pão para seu vizinho, isto será suficiente. O cristão tem apenas de ser agradável, bom e amável. Partilhar sua fé torna-se secundário em comparação com a maneira como você trata os outros."

Uma noite ouvi um grupo de médicos discutindo este conceito de "testemunho convincente, silencioso". Tudo o que você precisa fazer é praticar uma medicina boa e limpa e coser um bom ponto na incisão. O meio de testemunhar para Cristo é ser um especialista em sua profissão. Enquanto eles continuavam a debater este assunto, comentou um médico: "Quão longe teria ido o evangelho nos dias do apóstolo Paulo se o seu único testemunho fosse coser um bom ponto em suas tendas?''

Por outro lado, qual deve ser o nosso verdadeiro motivo para testemunhar? Há duas medidas exatas do nosso relacionamento pessoal com Deus. Primeira, quem possui nossos pensamentos? Durante a rotina terrena do viver diário, quão freqüentemente nossos pensamentos se voltam para Cristo sem um estímulo externo? A outra indicação da nossa intimidade com Deus é sobre quem gostamos muito de conversar. Amamos contar aos nossos amigos acerca de Jesus e Seu amor por nós?

Uma tarde, após o culto, reuni-me com um grupo para discutir o papel do testemunho cristão em nossa vida. Ao partilharmos nossas experiências, alguém disse:

 – Saibam vocês, nesta semana Deus nos proveu uma oportunidade de partilhar nossa fé. Pareceu providencial que alguém ficasse sem gasolina diante do nosso sítio. E assim, antes de ajudá-lo a fazer o seu carro voltar a correr, o fizemos prometer que viria hoje à igreja. X – Oh, ele veio?

– Não, ele não estava aqui. Não podemos compreender o por quê.

Se soubéssemos o que significa um relacionamento pessoal com Deus, não precisaríamos ter de buscar promessas para freqüência à igreja. Se estudássemos o intento original do testemunho cristão, teríamos de desfazer-nos de muitos dos truques que temos utilizado. Nossos métodos sintéticos têm indicado uma falta de experiência íntima com Cristo. Se realmente O conhecêssemos, teríamos sempre algo a partilhar concernente ao que Ele significa para nós, ao que Ele tem feito e está fazendo hoje por nós. Testemunharíamos, não porque alguém nos esteja forçando a isto, mas porque não poderíamos calar-nos a respeito de conhecer Sua presença e bondade em nossa vida. Então o nosso motivo em fazer mais para Deus seria o resultado da nossa experiência interior com Ele, ao invés de compulsão exterior vinda de outros.

A Bíblia nos apresenta exemplos do genuíno e espontâneo estender da mão aos outros. Havia um homem coxo que veio a Jerusalém à procura do grande Restaurador chamado Jesus. Mas ao chegar no final de uma tarde de sexta-feira, ouviu acerca de uma crucifixão ali num monte chamado Gólgota. As semanas se passaram, e as pessoas que o haviam trazido a Jerusalém voltaram para casa. Ali ele se assentou em desespero nas escadarias do Templo, pedindo esmolas para comer. Dois homens que tinham testemunhado a ascensão do seu Senhor ao Céu passavam por ali – Pedro e João. E eles disseram: "Não possuímos prata nem ouro; mas o que temos, isto te damos. Em nome de Jesus Cristo, o Nazareno, levanta-te e anda." E o homem saltou sobre seus pés. Mas isto não foi tudo – ele subiu correndo os degraus para o pátio do Templo e ali as autoridades finalmente o descobriram, pulando, saltando e louvando em alta voz. Louvando a Deus pelo que lhe tinha acontecido.

Se algo me aconteceu em relação ao meu Senhor, não posso guardar silêncio. Não preciso de alguém para me forçar a sair e testemunhar. Não preciso que alguém use manipulações psicológicas a fim de motivar-me.

Os leprosos e os cegos iam a Jesus em busca de auxílio, e Ele os curava. Em seguida Ele dizia: "Não contem a ninguém o que aconteceu." Mas isto não os detinha. Pelo contrário, eles corriam e gritavam e cantavam os louvores dAquele com quem tinham se encontrado. Eu gostaria de pensar que Jesus estava meramente lhes mostrando a impossibilidade de guardar silêncio. Esta é toda a essência do testemunho cristão. Se eu realmente conheço a Jesus Cristo como meu Amigo pessoal, se eu sei o que significa ter comunhão significativa diária com Ele, não posso ficar em silêncio!

Quando comecei no ministério, eu pensava tudo ao contrário. Eu pensava que se pudesse ter sucesso em levar os membros da igreja a se envolverem no trabalho missionário, eles seriam levados a uma experiência com Cristo. De sorte que eu procurava algumas personalidades dinâmicas para levar todos a se entusiasmarem com o testemunho. Mas o resultado era que muito poucos eram levados a uma experiência com Cristo, ao passo que a maioria acabava desanimada e frustrada.

Em outra igreja, resolvi tentar uma abordagem diferente. Desta vez minha premissa era que ninguém poderia possivelmente ser uma testemunha bem-sucedida para Cristo a menos que tivesse algum tipo de experiência com Ele. Quão ridículo seria comparecer a um tribunal como testemunha se eu não tivesse visto a cena! Ninguém acreditaria no que eu dissesse, a menos que eu mesmo tivesse estado lá. De sorte que desta vez resolvi pregar o reavivamento, a reforma e a justiça pela fé. Decidi falar acerca de Jesus, animando as pessoas a estudar, orar e procurar familiarizar-se com Deus em um relacionamento pessoal de um-para-um. E ao responderem, eu me reclinei na cadeira e disse: "É isto! Quando eles acham aquela experiência mais profunda com Cristo, eles saem e a partilham com outros. Não tenho de fazer nada para estimulá-los." Mas depois eles deixaram de sair e partilhar com outros, e como resultado, o reavivamento começou a azedar. Alguns daqueles que haviam se emocionado a respeito desta experiência com Cristo acabaram piores do que antes.

Desde então tenho me deparado com pessoas que têm tido problemas em sua vida devocional. Talvez elas tenham percebido o significado de aprender a conhecer melhor a Jesus e tenham realmente iniciado o privilégio e a alegria da verdadeira comunhão com Cristo através do estudo da Sua Palavra e da oração. Mas então as coisas começaram a ir mal, e em nove de dez casos, o motivo foi que eles não partilharam com outros sua experiência de conhecer a Cristo. Eu realmente acredito nisto, não apenas em teoria, mas na própria prática. Tenho recebido cartas e conversado com pessoas que me contam experiências pessoais que demonstram que o nosso relacionamento com Cristo não pode crescer a menos que nos envolvamos em alcançar outros para Ele.

Deus está ciente do grande princípio de que quando procuramos ajudar os outros, estamos ajudando mais a nós mesmos. Eis por que em Seu grande amor Ele nos tem concedido o privilégio de trabalhar com Ele por outros como um meio de comunicação com o Céu, como um meio de continuar em contato com o Céu. Esta é uma das facetas do testemunho cristão que negligenciamos com muita freqüência.

A fim de crescermos em nosso relacionamento com Deus é essencial que nos exercitemos partilhando com outros o que recebemos dEle. A atividade é a própria condição da vida, e aqueles que tentam permanecer cristãos aceitando passivamente os dons gratuitos e as bênçãos de Deus sem trabalhar para Ele, estão tentando viver comendo sem exercício. Na vida física isto sempre resulta em degeneração e decadência. Se recusamos exercitar nossos membros, logo perderemos qualquer poder ou capacidade de usá-los absolutamente.

O mesmo é verdade na vida espiritual. Se não exercitarmos nossas faculdades dadas por Deus, não somente deixaremos de crescer em Cristo, mas também perderemos a força que já tivemos. Se nos contentamos apenas em orar e meditar o dia todo sem sairmos para ajudar os outros, logo deixaremos completamente de orar. Por outro lado, a luz de Deus nos é dada para que possamos dá-la a outros, e quanto mais dermos, mais brilhante se tornará a nossa própria luz.

Assim, a única conclusão a que tenho sido capaz de chegar quanto ao problema do testemunho cristão, é que tão logo as pessoas se emocionem acerca do conhecimento de Jesus como um Amigo pessoal, devemos animá-las a testemunhar e prover toda oportunidade para envolvê-las no esforço missionário, partilhando e dando para que sua experiência com Cristo não morra.

Nosso problema é que temos apresentado freqüentemente a idéia do testemunho em termos de tocar campainha na porta de lares estranhos. Mas o que disse Jesus acerca do testemunho cristão? No país dos gadarenos, Jesus curou um endemoninhado e expulsou os espíritos malignos para uma manada de suínos. O povo ficou assustado e rogou a Jesus que partisse. O homem que fora curado queria ficar com Jesus, mas Jesus lhe disse: "Vai para tua casa, para os teus. Anuncia-lhes tudo o que o Senhor te fez, e como teve compaixão de ti." S. Marcos 5:19. E esse homem deve ter obedecido, porque na próxima vez que Jesus visitou aquele lugar, aqueles que antes Lhe tinham rogado que partisse, agora se apressaram em dar-Lhe as boas-vindas. Estavam ansiosos para vê-Lo, por causa do que esse homem lhes havia contado.

É verdade que Jesus nos ordenou a "ir por todo o mundo e pregar o evangelho" (S. Marcos 16:15), mas há muito pouco apoio para a idéia de que temos obrigação de sair em retirada abrupta e intempestiva para junto das pessoas que nunca vimos antes e atingi-las com um monte de doutrinas do evangelho. Em vez disto, eu saio para fazer amizade com elas, e depois serei capaz de contar-lhes quão grandes coisas o Senhor tem feito por mim. Que proveito há em bater às portas e em tocar campainhas de estranhos se eu não sou capaz nem mesmo de falar com a pessoa que está do outro lado do corredor da minha própria igreja acerca do amor de Jesus?

Há uma diferença entre nossa motivação para o testemunho e a de Deus por mandar-nos fazer isto. O propósito de Deus para o testemunho cristão é conservar-nos vivos nEle. Não é meramente para satisfazer as necessidades das pessoas "lá fora", mas para satisfazer nossas próprias necessidades. Ele não está esperando que nos tornemos peritos em apresentar a abordagem programada. Está esperando que nos demos conta de que a experiência pessoal com Cristo faz toda a diferença do mundo, e que percebamos que tornar-nos ativamente envolvidos com Ele na obra do evangelho é um privilégio dado por um Deus de amor.

Na vida diária, eu me familiarizo com você pela comunicação: falando-lhe, ouvindo você me falar, e indo a lugares e fazendo coisas juntos. Os mesmos princípios operam na vida espiritual: comunicação. Ouço a Deus através do estudo da Sua Palavra, falo com Ele por intermédio da oração, e vou a lugares e faço coisas com Ele envolvendo-me no testemunho cristão.

Deus sabe que como resultado de nos depararmos com provas e oposição ao testemunharmos, não somente nos aproximaremos mais de Jesus, mas também seremos levados a dobrar os joelhos com uma fome e sede de justiça ainda maior. Isto nos levará a buscar mais a Deus e nossa fé se fortalecerá enquanto nossa experiência com Cristo cresce, tornando-se mais profunda e mais rica. É verdade que outros também serão beneficiados quando nos envolvermos no testemunho cristão, mas o propósito principal de Deus é o nosso próprio bem.

Então devemos trabalhar para Deus a fim de salvar-nos a nós mesmos? Não, isto seria para nós um motivo egoísta. Nossa motivação para testemunhar é a alegria de saber quão maravilhoso Amigo achamos em Jesus e o desejo de partilhar esta felicidade com outros. Nossa motivação será o resultado espontâneo de termos uma experiência autêntica com Cristo. E esta alegria da comunhão com Ele não está reservada a apenas alguns. Todos nós podemos experimentá-la. E ao continuarmos a partilhar com outros o que temos recebido, estaremos operando nossa própria salvação, aprendendo a conhecer mais e mais a Cristo.

Isto aconteceu em um hospital de Nova Iorque, o qual fora fundado para ajudar os alcoólatras e aqueles com vícios ainda mais tenebrosos. Uma noite eles arrastaram um homem das ruas para dentro do hospital pela 50ª vez. De manhã o médico lhe disse:

– Bill, esta é a 50ª vez que você é internado aqui.

– Oh, então eu sou um cliente de meio século? Posso tomar um trago para comemorar?

– Você pode esquecer a comédia – respondeu o médico. – Mas eu lhe darei um trago se você sair da cama e me fizer um favor.

– Oh, dê-me o meu roupão de banho.

– Descendo o corredor há um jovem que na noite passada entrou neste hospital pela primeira vez – disse o médico. – Tudo o que eu quero que você faça é permitir que ele dê uma olhada para você. Não precisa dizer uma palavra. Apenas uma olhada para você poderia espantá-lo a ponto de jamais tomar outro trago.

Assim Bill desceu tropeçando o corredor e entrou no quarto do homem mais jovem. Ali estava ele – olhos injetados e costeletas emaranhadas. O sujeito mais jovem não pôde deixar de compreender a mensagem. Mas então aconteceu uma coisa estranha. Em vez de afastar-se, Bill começou a sentir-se penalizado por esse jovem, vítima do álcool. Disse ele:

– Você sabe, há algumas pessoas que não podem beber, e você tem de aprender a tempo.

– Não, obrigado. Eu não posso – respondeu o jovem.

– Você deve – disse Bill. – Tem de acreditar em um poder maior do que você mesmo.

– Não creio em um poder maior do que eu mesmo.

– Oh, sim, você crê! – retrucou Bill. – A garrafa é maior do que você!

E ele continuou por toda a manhã a conversar com esse homem, e finalmente, quando viu uma pequena reação no coração do jovem, quase gritou de alegria. x– O que devo fazer? – perguntou o jovem.

– Ore. E então permita-me que o ajude – respondeu Bill.

Ele estava tão surpreso ante suas próprias palavras que quase caiu. Mas ele continuou a conversar com esse jovem, citando textos bíblicos que havia aprendido em sua infância. Antes de partirem naquela manhã, Bill prometeu que se manteria em contato com o jovem para animá-lo e orar com ele.

Depois disto, Bill fez muitas visitas ao hospital, porém nunca mais como paciente. Em vez disto, ele ia como o fundador de uma organização mundial conhecida como Alcoólicos Anônimos. Sua premissa baseia-se na teoria de que ao tentar ajudar alguém, você sempre ajuda mais a si mesmo.

Deus sabe que isto é verdade. Ele pôs em operação este princípio. E em Seu amor Ele hoje nos convida a responder ao Seu convite de envolver-nos com Ele no trabalho em prol dos outros.

 

Querido Pai celestial, obrigado pelo privilégio que nos tens dado de envolver-nos contigo na obra do evangelho. Às vezes temos pensado ser isto uma incumbência difícil ou desagradável. Livra-nos de confiar em abordagens programadas e perdoa-nos por todas as coisas que temos tentado fazer a fim de escapar do envolvimento no esforço missionário. Ajuda-nos a conhecer tão bem a Ti que não sejamos capazes de ficar em silêncio, para que continuemos a contar aos outros o que Tu significas para nós. Agradecemos-Te por Tua misericórdia e paciência enquanto aprendemos a conhecer-Te melhor. Em nome de Jesus. Amém.

 

 

Extraído do livro: Como tornar real o cristianismo.