Série de Estudos: A plenitude dos tempos

por Henderson Hermes Leite Velten

extraído do Site www.concertoeterno.com

 

1. A Profecia - Base da Mensagem Cristã

 

Jesus, os Apóstolos e as Profecias.

 

As profecias bíblicas exercem um papel preeminente na mensagem cristã. Os primeiros discípulos delas se serviram para proclamar ao mundo que Jesus era “o Cristo, o Filho do Deus vivo” Mateus 16:16. O apóstolo Pedro, por exemplo, afirmou que, pela ignorância das autoridades judaicas, ao conduzirem Jesus à morte, “Deus assim cumpriu o que dantes anunciara por boca de todos os profetas que o Seu Cristo havia de padecer.” “E todos os profetas, a começar com Samuel, assim como todos quantos depois falaram, também anunciaram estes dias.”Atos 3:18 e 24. Paulo, o “apóstolo dos gentios”, pregando numa sinagoga de Antioquia, também fez menção das profecias messiânicas para anunciar Jesus, declarando que “os que habitavam em Jerusalém e as suas autoridades, não conhecendo Jesus nem os ensinos dos profetas que se lêem todos os sábados, quando O condenaram, cumpriram as profecias... Depois de cumprirem tudo o que a respeito dEle estava escrito... puseram-nO em um túmulo. Mas Deus O ressuscitou dentre os mortos.”Atos 13:26-31. Outro exemplo do uso das profecias como prova convincente da messianidade de Jesus se observa em “Apolo, homem eloqüente e poderoso nas Escrituras... porque, com grande poder, convencia publicamente os judeus, provando, por meio das Escrituras, que o Cristo é Jesus.” Atos 18:24 e 28. Assim, torna-se evidente que as profecias referentes ao Salvador ocupavam uma posição de grande destaque nas primitivas pregações cristãs. Ver também Atos 10:43; 17:2, 3 e 11; 26:22 e 23; e 28:23.

 

O próprio Jesus lançou mão das profecias para revelar mais claramente a natureza de Seu ministério. Falando aos desalentados discípulos no caminho de Emaús, disse o Mestre galileu: “Ó néscios e tardos de coração para crer tudo o que os profetas disseram! Porventura, não convinha que o Cristo padecesse e entrasse na Sua glória? E, começando por Moisés, discorrendo por todos os Profetas, expunha-lhes o que a Seu respeito constava em todas as Escrituras.” Lucas 24:25-27. Mais tarde, estando com aqueles que durante 3 anos e meio não conseguiram discernir a verdadeira essência de Sua missão, disse Jesus: “São estas as palavras que Eu vos falei, estando ainda convosco: importava se cumprisse tudo o que de Mim está escrito na Lei de Moisés, nos Profetas e nos Salmos.” Diz o relato inspirado que “então, lhes abriu o entendimento para compreenderem as Escrituras; e lhes disse: Assim está escrito que o Cristo havia de padecer e ressuscitar dentre os mortos no terceiro dia e que em Seu nome se pregasse arrependimento para remissão de pecados a todas as nações, começando de Jerusalém.” Lucas 24:44-47.

 

 

 

A Importância da Cronologia Profética.

 

As páginas do Antigo Testamento estão repletas de referências proféticas ao Redentor do mundo, descrevendo Sua derrota aparente e Seu triunfo final. No entanto, sem uma indicação clara quanto ao tempo de Sua manifestação, a identificação do Messias estaria profundamente comprometida. Um leitor de Isaías 53, por exemplo, ficaria a se indagar “a quem se refere o profeta. Fala de si mesmo ou de algum outro?” Atos 8:34. Tal dúvida seria pertinente, visto que o próprio Isaías fora martirizado; e, além dele, muitos outros já haviam sofrido injustamente. Para não dar margem a tais incertezas, Deus revelou certos períodos de tempo que atingissem a própria época do Messias, delimitando o início de Sua obra terrestre bem como o seu encerramento. Tais períodos são claramente delineados em Daniel 9, na célebre profecia das 70 semanas.

 

Agostinho, bispo de Hipona e um dos maiores expoentes da fé católica de todos os tempos, fez alusão a essa impressionante profecia, declarando que “Daniel determinou até o número de anos que passariam antes do advento e paixão de Cristo. O cômputo seria longo reproduzi-lo aqui, além de que outros já o fizeram antes de mim” (SANTO AGOSTINHO, A Cidade de Deus, tomo 2, capítulo XXXIV, n.º 1). Realmente, antes dele, muitos eminentes escritores cristãos já haviam tratado do tema, dentre os quais podem ser citados Tertuliano (terceiro século), Clemente de Alexandria (terceiro século), Hipólito (terceiro século), Júlio Africano (terceiro século) e Eusébio de Cesaréia (quarto século), que, embora apresentem inúmeros equívocos exegéticos em suas obras, ao menos demonstraram interesse pelos cômputos proféticos.

 

É óbvio que o Senhor Jesus também tinha ciência dessa profecia, sendo, em realidade, Seu legítimo Autor. Em Mateus 24:15, fazendo referência ao texto das 70 semanas e conectando-o ao evento da destruição de Jerusalém a se verificar no ano 70 da Era Cristã, advertiu Jesus: “Quando, pois, virdes o abominável da desolação de que falou o profeta Daniel, no lugar santo (quem lê entenda).” Ver Daniel 9:27. Depreende-se desse texto que Jesus não somente reconhecia a importância da profecia de Daniel, aplicando-a ao Seu tempo, mas ainda recomendava o seu estudo e correta compreensão.

 

 

Referências Cronológicas em o Novo Testamento.

 

Que os escritores neotestamentários estavam a par dos períodos proféticos de Daniel 9 e reconheceram Sua aplicabilidade à vida e obra de Jesus, observa-se de várias passagens dos Evangelhos e das Epístolas. Nesses versículos, fica patente que havia um tempo definido para o nascimento de Jesus, pois, segundo o apóstolo Paulo, “vindo, porém, a plenitude do tempo, Deus enviou Seu Filho, nascido de mulher, nascido sob a lei.” Gálatas 4:4.

 

“Depois de João ter sido preso, foi Jesus para a Galiléia, pregando o evangelho de Deus, dizendo: O tempo está cumprido, e o reino de Deus está próximo; arrependei-vos e crede no evangelho.” Marcos 1:14 e 15. Ver também os versos 12 e 13. Com esse anúncio, Jesus reconheceu que o prazo estipulado para o início de Seu ministério havia expirado.

 

Cada atividade a ser desenvolvida no ministério do Senhor tinha seu momento certo nos planos de Deus. Exemplo disso se extrai do episódio em que Maria rogou a Jesus que Ele interviesse miraculosamente devido à falta inesperada de vinho nas bodas de Caná. A resposta de Jesus foi: “Mulher, que tenho Eu contigo? Ainda não é chegada a Minha hora.”João 2:4.

 

Nos planos de Deus, havia também um momento certo para Jesus Se dirigir a Jerusalém, que seria o palco de Sua paixão e morte: 

 

“Disse-lhes, pois, Jesus: O Meu tempo ainda não chegou, mas o vosso sempre está presente.” João 7:6.

 

 “Subi vós outros à festa; Eu, por enquanto, não subo, porque o Meu tempo ainda não está cumprido.” João 7:8. 

 

A razão pela qual os judeus falharam várias vezes em suas tentativas de prender a Jesus é dada nos seguintes termos:

 

“Então, procuravam prendê-lO; mas ninguém Lhe pôs a mão, porque ainda não era chegada a Sua hora.” João 7:30.

 

“Proferiu Ele estas palavras no lugar do gazofilácio, quando ensinava no templo; e ninguém O prendeu, porque não era ainda chegada a Sua hora.” João 8:20.

 

Ao aproximar-se o tempo de Seu sofrimento, Jesus assim Se expressou: “É chegada a hora de ser glorificado o Filho do Homem.” “Agora, está angustiada a Minha alma, e que direi Eu? Pai, salva-me desta hora? Mas precisamente com este propósito vim para esta hora.” João 12:23 e 27.

 

Também havia um prazo para Cristo ascender ao Céu:

 

“Ora, antes da Festa da Páscoa, sabendo Jesus que era chegada a Sua hora de passar deste mundo para o Pai, tendo amado os Seus que estavam no mundo, amou-os até ao fim.” João 13:1.

 

Por fim, na noite da Última Ceia, ao dirigir-Se ao monte das Oliveiras, no qual deveria passar pelas tenebrosas horas do Getsêmani, Jesus “levantou os olhos ao céu e disse: Pai, é chegada a hora; glorifica a Teu Filho, para que o Filho Te glorifique a Ti.” João 17:1.

 

Sim, tudo na missão de Cristo pertencia a um momento determinado. Cada etapa de Seu ministério se cumpriu em perfeito sincronismo com o relógio de Deus, o que inspirou o autor da epístola aos Hebreus a declarar que, “ao se cumprirem os tempos”, Ele “Se manifestou uma vez por todas, para aniquilar, pelo sacrifício de Si mesmo, o pecado.” Hebreus 9:26. Quando Jesus expirou no madeiro do Gólgota, Ele venceu a Satanás de uma vez por todas, resgatando, por meio de Seu sangue, este mundo para Deus. Era a isso que Ele Se referia, quando anunciou: “Chegou o momento de ser julgado este mundo, e agora o seu príncipe será expulso.” João 12:31. Ver Colossenses 2:13-15. Tendo isso em vista, entende-se melhor o protesto dos endemoninhados de Gadara: “Que temos nós contigo, ó Filho de Deus! Vieste aqui atormentar-nos antes de tempo?” Mateus 8:29. Quão preciosa é a Cruz do Calvário para todo filho de Deus! Foi ali que o “Deus feito homem” redimiu a Humanidade do cativeiro do pecado, abrindo-lhe os portais da salvação. No momento certo, Ele interveio; ou, como escreveu Paulo, “Cristo, quando nós ainda éramos fracos, morreu a Seu tempo pelos ímpios.” Romanos 5:6. Tão profundo amor nem toda a eternidade poderá desvendar! Ela inspirará a mais profunda gratidão nos seres redimidos para sempre!

 

Outras referências relevantes sobre o aspecto cronológico em relação ao ministério de Jesus podem ser encontradas nos seguintes textos: Mateus 26:18 e 45; Marcos 14:35 e 41; Lucas 22:53; João 4:21 e 23; 5:25; 16:21, 25 e 32; Romanos 3:26; 1 Timóteo 2:6; e Tito 1:3.

 

Os próximos estudos desta série tratarão mais profundamente dos períodos proféticos de Daniel. Também será objeto de análise a tipologia das festas judaicas, que servem como cronograma do plano da redenção. Tal estudo se destina a propiciar sólidas evidências para todo aquele que deseja fundamentar melhor a sua fé. Que a benção de Deus possa repousar sobre os leitores deste e dos próximos estudos e que a fé em Jesus e em Sua palavra possa ser fortalecida em seus corações!

 

 

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Bibliografia:

 

CLEMENT, The Stromata, ou Miscellanies, livro 1, capítulo 21, em Ante-Nicene Fathers, vol. 2. Editado por A. Roberts e J. Donaldson. Grand Rapids, Mich.: Wm B. Eerdmans Publishing Co., 1.957.

 

EUSÉBIO DE CESARÉIA, História Eclesiástica, tradução de Lucy Iamakami e Luís Aron de Macedo, primeira edição, Casa Publicadora das Assembléias de Deus, 1.999.

 

FROOM, Le Roy, The Prophetic Faith of Our Fathers - The Historical Development of Prophetic Interpretation, vol. 1, Washington, D.C.: Review and Herald.

 

FROOM, Le Roy, The Prophetic Faith of Our Fathers - The Historical Development of Prophetic Interpretation, vol. 4, Washington, D.C.: Review and Herald.

 

HIPPOLYTUS, Fragments from Commentaries, “On Daniel”, fragmento 2,  capítulos 10-16, em Ante-Nicene Fathers, vol. 5. Editado por A. Roberts e J. Donaldson. Grand Rapids, Mich.: Wm B. Eerdmans Publishing Co., 1.957.

 

JULIUS AFRICANUS, The Extant Fragments of the Five Books of the Chronography of Julius Africanus, em Ante-Nicene Fathers, vol. 6. Editado por A. Roberts e J. Donaldson. Grand Rapids, Mich.: Wm B. Eerdmans Publishing Co., 1.957.

 

SANTO AGOSTINHO, A Cidade de Deus, tomo 2, Petrópolis, R.J.: Editora Vozes Ltda. .

 

TERTULLIAN, An Answer to the Jews, capítulos 8 e 11, em Ante-Nicene Fathers, vol. 3. Editado por A. Roberts e J. Donaldson. Grand Rapids, Mich.: Wm B. Eerdmans Publishing Co., 1.957.